segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Hoje


Hoje, liberto todo o meu passado
Hoje, as correntes que enferrujaram meu pulso foram quebradas
Agora quero que as folhas se mexam quando eu passar
Quero que o vermelho pulse no marrom das minhas veias

Hoje, caro amigo, quero respirar o ar morno das florestas
Hoje, caro amigo, quero viver. Viver nas entranhas perfumadas no teu corpo.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

De repente


De repente
Os dedos se separaram
De repente
A chuva começou
De repente
A música melancólica fez sentido
De repente
As luzes dos olhares se apagaram
De repente
O ponteiro do relógio é ouvido
De repente
Não há sorrisos e dias ensolarados

De repente
De repente
De repente

A dor martela
Arde
Mata
De repente
O oceano invade o travesseiro
De repente
A gente cai
De repente
A gente pára.

domingo, 7 de outubro de 2012

Até que um dia, alguém reparou nos longos e enrolados cabelos negros
Eles estavam imóveis
Volumosos
Não tinha nada que chamasse atenção
A não ser as curvas e mistérios em cada esquina
Que guardava

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Encontro

A lente do óculos fundo de garrafa
O café quente
Os dedos longos e finos
O mármore da bancada fria
E duas almas se olhando de canto
Nas esquinas da cafeteria

O cheiro forte dos grãos cafeinados em suas roupas

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Agulha

-Mamãe, olha o que eu fiz.

Viveu tudo o que tinha de viver. Pulou carnavais da Era do Ouro. Trocou beijos secretos na misteriosa escuridão das agitadas avenidas do Rio de Janeiro.
Viu a vida passar pelos seus olhos, sentiu os melhores toques que a mente pudesse imaginar.

Teceu o mehor tecido.
Costurou a melhor roupa.
Confeccionou os melhores sapatos.

Hoje, vive num mundo paralelo.
Num mundo onde os tecidos são da mais escassa qualidade
Mas os detalhes permanecem
A confusão dos laços e babados nas bonecas
Os nomes no diminutivo
A televisão que grita

Enquanto pacientes dedos acompanham a harmonia silenciosa das lembranças de outrora.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Virgínia II

Manhã ensolarada. Virginia, na porta do apartamento, tentava encontrar as chaves na bolsa. Tirou metade das coisas que trazia da viagem. Foi à Barcelona. Trazia nos cabelos os resquícios do vento europeu. Sentia as mãos diferentes tentando alcancar o molho. Achou no fundo, como se fosse o ultimo objeto a ser despejado na imensa bolsa verde.
Abriu a porta, jogou as coisas no ainda embalado sofá. Lembrou-se que havia mobiliado o apartamento recentemente. Haviam caixas espalhadas no branco azulejo do chão e móveis mal arrumados. Rasgou o plástico do sofá, cheirou-o e deitou o rosto enterrado nas almofadas. Virgínia queria saber pra onde iria dessa vez. Paris, será?
Não... teria que ter mais essa viagem, chegar com a perna engessada e aí sim ir ao sonhado destino.
Quando criança, imaginava-se cheia de panos escuros olhando as movimentadas ruas parisienses. Via-se nos cafés, olhando tudo a sua volta. Nem precisava andar. Só queria olhar. Sempre teve aqueles olhos grandes e expressivos. Quis acender um cigarro, mas lembrou que parou de fumar.
Então, pôs-se a chorar. Chorou a noite toda, sentindo a almofada com cheiro de plástico. Virou-se, olhou o teto branco, a luminária de cristal. A visão embaçada não permitia observar detalhes. Sabia que estava sozinha. Mais uma vez. Levantou-se, limpou os olhos e se maquiou.
Virgínia usava botas pretas. Queria voltar sem elas.

Saiu, colocando as chaves no bolso.
Voltou três dias depois com uma casca no coração e um enfeite no cabelo.
Os móveis ganharam vida.
Viajou para Paris.

Nunca mais voltou ao Brasil.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Eu não peço nada não, seu moço

Eu não peço nada não, seu moço
Só quero um cadim desse açúçar e uma dosinha de amor
Eu não peço nada não, seu moço
Prometo ficar calada
Até meu coração gritar de agonia

E sumir no primeiro raio de sol

sexta-feira, 2 de março de 2012

Flor

Quando eu acordei, descobri que o homem com uma flor no chapéu existia.
Posso voltar a sonhar...

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

oito de fevereiro

Tem dias em que até uma bolha se torna demasiadamente grande e solitária pro tamanho da nossa solidão.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...

Roda Viva - Chico Buarque

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Teresinha

Chico Buarque

O primeiro me chegou
Como quem vem do florista:
Trouxe um bicho de pelúcia,
Trouxe um broche de ametista.
Me contou suas viagens
E as vantagens que ele tinha.
Me mostrou o seu relógio;
Me chamava de rainha.

Me encontrou tão desarmada,
Que tocou meu coração,
Mas não me negava nada
E, assustada, eu disse "não"

O segundo me chegou
Como quem chega do bar:
Trouxe um litro de aguardente
Tão amarga de tragar.
Indagou o meu passado
E cheirou minha comida.
Vasculhou minha gaveta;
Me chamava de perdida.

Me encontrou tão desarmada,
Que arranhou meu coração,
Mas não me entregava nada
E, assustada, eu disse "não"

O terceiro me chegou
Como quem chega do nada:
Ele não me trouxe nada,
Também nada perguntou.
Mal sei como ele se chama,
Mas entendo o que ele quer!
Se deitou na minha cama
E me chama de mulher.

Foi chegando sorrateiro
E antes que eu dissesse não,
Se instalou feito posseiro
Dentro do meu coração.



Eu  e meus amores e decisões confusas
Daquelas que faz a porta do armário gritar
Que faz o coração pulsar.